Diferentes formas de se imaginar o mesmo objeto

Uma surpresa agradabilíssima foi chegar à Escola Dirce de Almeida Braga Wrasek e encontrar árvores frondosas e belas sombreando tapetes, almofadas e crianças que pegavam livros diversos dependurados por barbantes nos galhos das árvores.

Agradável também foi a forma como fomos recebidos, muito carinho e atenção demonstrados desde a ajuda para levar os nossos materiais até a quadra da escola onde contaríamos as histórias, o almoço cuidadosamente preparado pelas senhoras: Solange, Simone e Nena, e copos d’água gelados e transbordantes para amenizar aquele calor de muitos graus.

Tivemos tempo de andar pelo belo jardim da escola e circular por entre seus vários espaços visivelmente bem cuidados. Chamou-nos a atenção uma árvore, até então desconhecida, para nós, de flor exuberante, vagens generosas e fruto que nos fez querer saber se era comestível. Que árvore seria aquela? Embora tenhamos perguntado para várias pessoas só conseguimos saber seu nome quase na hora de nossa saída da escola: – Essa árvore é a “cacau falso” e algumas pessoas comem. Respondeu-nos um solícito senhor que nos deu a informação com uma satisfação impressionante nos mostrando o fruto para justificar o nome da árvore.

Na quadra alunos e alunas se organizaram em um semicírculo e fiquei muito a vontade para começar nossa contação de histórias. Algumas delas, contei usando objetos, outras imagens, recortes, personagens confeccionados em papel, tecido ou brinquedos feitos a partir de material reciclado. Ao terminar a contação, um aluno se aproximou e falou que quando eu usei o guarda-chuva para contar a história “O menino que colecionava guarda-chuvas” ele, pensou que eu fosse falar que o objeto podia se transformar em um barco ou no telhado de uma cabana. Apesar de várias outras possibilidades de transformação terem sido apresentadas pelo próprio autor da história, a criança não se limitou as opções dadas. Enquanto a história era sendo contada ele foi reelaborando novas possibilidades, buscando outras formas de, como Felipe, personagem da história, brincar com o guarda-chuvas de forma criativa e inimaginável para aqueles que não tem criatividade ou que não ousam extrapolar a realidade para brincar com a fantasia, o imaterial, o fantástico ou o que aparentemente não é possível vir a tona através de expressões corriqueiras.

Contar histórias, tem nos proporcionado, descobertas de gente, de lugares e de coisas que nos faz sentir privilegiados por podermos viver momentos tão ricos. Estamos aprendendo enquanto caminhamos, enquanto ouvimos, enquanto desejamos ser ouvidos. O que nos impulsiona é o olho inquieto da criança que se aproxima de nós para pegar em um objeto que acabamos de mostrar, de expor, de usar. Ao passar para suas mãos esse mesmo objeto vai magicamente se transformado naquilo que a criança quiser e por quanto tempo ela quiser. Às vezes apenas o tempo suficiente para transformar a fita que decora o pau de chuva em um cabo de aço inquebrantável. Essa é a magia da contação de histórias.

Ainda ouvimos as histórias dos alunos Davi e Felipe, que respectivamente contaram as histórias dos Três Porquinhos e outra autoral, em que um menino que sai de casa para comprar pão se perde na floresta Amazônica e tenta, de várias maneiras, voltar para casa. Enquanto contava a história, Felipe repetia constantemente que naquele tempo não existia telefone celular, segundo ele, se existisse era só ligar para casa e avisar pedindo ajuda. Mesmo sem celular, o menino conseguiu “se salvar” construindo objetos que não necessitam de nenhum equipamento eletrônico para serem construídos. Felipe conseguiu transitar entre o mundo real, no qual ele vive e onde o telefone celular é praticamente a extensão do corpo das pessoas, e, o mundo imaginário, onde a natureza é fascinante e dominante tanto oferecendo o perigo quanto as possibilidades para se livrar dele. A beleza dessa viagem entre o real e o imaginário é que Felipe reconhecia que se ele tivesse em mãos o telefone celular, tudo poderia ser resolvido facilmente, a grandiosidade de sua narrativa está justamente por ele saber da existência do telefone celular e não lançar mão dele para resolver o problema do personagem. Seu esforço para buscar outra solução nos revela sua maturidade criativa ao reconhecer que as histórias não precisam serem simplificadas apenas pelo fato de se conhecer no tempo de agora, elementos facilitadores para a resolução de conflitos de outros tempos.

Socorro Lacerda de Lacerda e Lucio Lacerda

Nossos sinceros agradecimentos à Secretária de Educação do Município de Aparecida D’Oeste, Fernanda Carvalho de Menezes, à diretora da Escola Dirce de Almeida Braga Wrasek, Amanda V. Felício Tominaga, a coordenadora, Marta Eliana G de Sanches e ao corpo docente e funcionários: Valdirene, Aracélia, Kerusca, Alma, Felipe, Regiane, Maria Aparecida, Érica, Carlos, Simone, Elton, patrícia, Cirlene, Gilza, Carla, Adriane e Zeiza.

8 comentários em “Diferentes formas de se imaginar o mesmo objeto

  1. O trabalho que vcs realizam é gratificante, maravilhoso e muitos outros adjetivos ,vcs levam conhecimento e alegria .
    Parabéns pelo trabalho e exemplo que nos proporcionou.

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