Essa foi a primeira frase que li ao chegar à Escola Municipal Raquel Alves Porto no distrito de Timorante, município de Bandeira/MG. Ao ler esta frase, percebi que havia chegado à uma escola em que a leitura se presentificava nos vários e convidativos espaços com suas escritas e cartazes ilustrando e fazendo lembrar a leitura como elemento essencial para as múltiplas aprendizagens.
“Ler para se libertar do mundo comum” estava escrito em um cartaz feito com muito capricho, com uma criança abrindo um livro de onde saltavam letras e números aparentemente desordenados. Logo transportei-me da desordem das letras para a desordem do mundo. Um mundo que apresenta mais que nunca a necessidade de uma ordenação que respeite cada uma das realidades e necessidades individuais que inevitavelmente se refletirão no coletivo. Certamente, apenas a leitura não será capaz dessa ordenação, é preciso que o homem que lê se revista de criticidade a partir do que seja capaz de ler e de compreender, sem medo, seus desejos e suas necessidades para viver de forma digna sem os abusos de autoridades nem a ausência dos direitos que lhes são negados ou negligenciados.
Toda essa reflexão foi feita rapidamente, pois a forma respeitosa e carinhosa com a qual fomos recebidos era mais urgente. Talvez por que aquele escrito só será compreendido pelas crianças, que nos aguardavam ansiosas, algum tempo depois, quando se derem conta de que o que aprendem naquela escola, o significado da frase que tanto me chamou a atenção e, espero que também as histórias que contamos, fará sentido quando suas vidas buscarem no passado as aprendizagens e o legados, aparentemente inocentes, daquele momento.
A recepção, as risadas durante a contação, o sentar ordenado em cadeiras trazidas das salas de aula e colocadas no pequeno pátio, a curiosidade dos que não estudavam ali, as histórias escolhidas para serem contadas e os objetos e imagens que as ilustrariam, os olhos inquietos, os desejos saltitantes e a minha curiosidade para conhecer os arredores da escola e as pessoas daquele povoado tão singular, tranquilo e belo, faziam muito sentido para mim e me deixavam feliz por ter percorrido aquela estradinha ladeada por árvores que eu não conhecia para chegar naquele lugar que me fez tanto bem.
Contar histórias na Escola Municipal Raquel Alves Porto, em um espaço pronto para minha apresentação, foi tão instigante quanto, creio eu, necessário. Necessário tanto para as crianças que escutaram atentamente, quanto para mim, que me colocava diante de um mundo pronto para ser lido e vivido de forma compartilhada com aquela gente animada e curiosa, moradores de um povoado com suas calçadas tão altas quanto o desejo de sair voando em busca de um mundo incomum. Na verdade, aquele lugar, aquela escola, aquela gente, e muito menos a enorme área verdejante e convidativa para andar de pés descalços não tinha nada de comum. Comum era apenas quem não via a riqueza daquele lugar como espaço apropriado para leituras de mundo em escritos que ainda não foram inventados.
Quem será capaz de os inventar? Talvez, os próprios estudantes na construção da significativa memória que estava sendo construída ali, naquele momento, diante de todos.
Gratidão por nos presentear com tantas aprendizagens.
Coquita