Diamante: Uma Joia Rara II

Inevitavelmente, criamos uma expectativa em relação a nossa chegada à próxima escola e se lá o aviso sobre nossa ida havia chegado. Uma preocupação que não deveria existir devido à seriedade com a qual organizamos nosso cronograma após contato direto com secretários de cada um dos municípios para o qual nos dispusemos a ir.
Para chegarmos onde trabalharíamos no período da tarde, além de uma estrada bastante desgastada, a distância era enorme. Precisamos parar muitas vezes pelo caminho para perguntar às raras pessoas que encontrávamos, se estávamos na direção certa. Nem a distância, muito menos a estrada poeirenta, nos fizeram desistir de seguirmos em frente, embora a experiência da escola anterior nos fizesse pensar se passaríamos pela mesma situação da falta de informação entre os órgãos.

Finalmente chegamos à Barra de Oitís e percebemos logo de início que não se tratava de uma escola rural qualquer. Barra de Oitís era um distrito de Diamante. Nos chamou a atenção o grande número de pessoas que circulavam desde que avistamos o distrito, logo percebemos que se tratava da saída dos alunos devido ao final no turno de aulas. Embora tivéssemos agendado nosso trabalho para às 14h, resolvemos chegar bem mais cedo. Gostávamos de conhecer o entorno da escola e conversar com as pessoas que encontrávamos pelo caminho. Isso já nos rendia bons papos e ótimas histórias.

Conhecer gente e suas histórias de vida, independentemente de registrá-las ou não, tinha para nós uma grande importância. Era conhecendo gente e, mesmo por pouco tempo, nos relacionando com elas que enriquecíamos nossa própria história de vida, pois inevitavelmente carregaríamos conosco parte de suas experiências e dos seus sonhos. Nosso projeto não era apenas contar histórias para as crianças, era também conhecer um pouco dos lugares, das pessoas e da cultura de um povo que mesmo compartilhando a mesma região, tinha suas semelhanças e diferenças.

Gostamos de chegar e ver tanta gente. Gente de diferentes idades, conversando animadamente, exibindo seus materiais enquanto se apressavam para não perder o ônibus escolar que os levaria até os sítios vizinhos onde moravam.

Foi fácil encontrar a EMPG José Antônio Barros. Era uma escola relativamente grande e se localizava em destaque na primeira rua por onde chegamos. Entramos e percebemos que as pessoas estavam de saída. Alguns professores que encontramos nos levaram até a sala da diretora, que também estava se organizando para pegar o ônibus escolar. Junto a ela estava o coordenador pedagógico, que embora apressado, também nos recebeu muito bem. Porém, para nossa surpresa, também não sabiam que havia um agendamento para nossa apresentação. Ficaram tão surpresos quanto nós e lamentaram profundamente não contarem com nossa apresentação, pois para eles representava uma perda de oportunidade significativa diante da carência por atividades vindas do exterior da escola.

Nossa decepção foi ainda maior quando soubemos que naquela escola não funcionava o segundo turno. Isto é, havíamos feito um agendamento junto à Secretaria de Educação do Município para irmos a uma escola no período da tarde, quando na verdade essa escola não funciona nesse período. Isso mesmo!
Diante de tamanho desencontro e desapontamento de nossa parte, ficamos extremamente desanimados para continuarmos nossas visitas nas escolas do município que havíamos agendado para o dia seguinte. Entramos em contato com a Secretaria de Educação, que nos pediu desculpas e reconheceu que houve um equívoco pelo não funcionamento da escola no período indicado.

Nosso desânimo não nos deixou trabalharmos mais naquele município e cancelamos nossa visita para as demais escolas, que seriam: EM João Galdino – Sítio Engenho Velho, EM João Olegário – Sítio Porções e Assentamento Lampião, no sítio Saco Velho. Lamentamos por precisarmos fazer isso, como lamentamos também terminar nossa primeira etapa de forma tão diferente de como começamos.

Vivemos nessa primeira etapa experiências que nos enriqueceram e nos animaram profundamente, que nos surpreenderam positivamente e nos decepcionaram, escolas funcionando de forma extremamente satisfatórias enquanto outras se apresentavam descuidadas e sem condições adequadas para seu funcionamento. Porém, em nenhuma delas encontramos professores ou professoras que não estavam imbuídas e conscientes do seu papel de educadoras, que não tivessem a clareza de que a educação passa por momentos críticos de desvalorização e desrespeito, que em sua maioria os estudantes não são levados a sério. Vimos os ônibus escolares, direito de alunos e alunas, se locomoverem entre suas casas e as escolas onde estudam, serem substituídos por velhas caminhonetes com cobertura improvisada por desgastadas lonas e bancos desconfortáveis de madeira para as crianças sentarem e enfrentarem as péssimas condições de descuidadas estradas de terra.

Escolas antigas sendo derrubada para a construção de novas, reformas bem-sucedidas, outras escolas necessitando urgentemente de reformas, banheiros ainda sendo usados fora do prédio, sujeitando as crianças às intempéries, expondo-as às doenças mais banais por falta de saneamento básico e cuidados mínimos com higiene. Desrespeito, descaso, descontentamento.

Não ficamos só nisso. Para nossa alegria encontramos também, secretários de educação dentro da escola separando material junto com professores/as e alunos/as, se fazendo presentes no cotidiano da escola, querendo saber de suas necessidades. Professoras e professores extremamente compromissados, sérios, guerreiros, capazes de se emocionar com as aprendizagens e as descobertas dos seus alunos e alunas. Gente que sabe que é o seu trabalho que pode mudar a realidade de crianças e jovens que muitas vezes não se dão conta de que existe vida além daqueles recantos quase sempre esquecidos pelo poder público.

As descobertas foram muitas e valiosas. Quando me perguntam como foi viajar tanto para contar histórias em lugares tão isolados e distantes, não tenho outra resposta senão a de que vivi momentos de extrema felicidade.
E é por querer continuar sendo feliz que já estamos nos preparando para a segunda etapa do projeto “Conte lá que eu conto cá”. Seguiremos para o sul de Minas Gerais e nos preparar para mais uma etapa já nos enche de alegria.

Até breve!

Socorro Lacerda de Lacerda

4 comentários On Diamante: Uma Joia Rara II

  • Fiquei muito triste com a falta de comunicação e principalmente pelas crianças que perderam uma oportunidade maravilhosa de embarcarem nessa viagem deslumbrante!

  • Socorro, você é um exemplo!
    Me emociono ao ler seus relatos, em perceber a dignidade que tem como profissional, em observar a garra, respeito e amor pela educação, você me inspira em ser perseverante é acreditar que podemos ter uma sala de aula melhor.
    Você é uma educadora NOTA 10.
    PARABÉNS!!!

    • Cleide, minha querida! Eu sou o resultado das pessoas que fui conhecendo ao longo da minha vida. Certamente eu tenho muito de você. Obrigada pelo apoio.
      Um abraço!

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